Título

(Laís Moura)

O que meu coração sente vem sendo uma fagulha adormecida que só desperta quando vomito amor. Meu corpo trêmulo está diante de uma geladeira no modo automático de pegar água. Meus olhos sobem e descem, varrendo o corpo da cozinha, e a dormência que a frustração traz consigo me vira de ponta cabeça. Volto a ser criança: esqueço de andar. Minha mente fraca gagueja e me segura pela mão: me mostra homem. Volta e meia me vejo envolvida em fantasias sorrateiras que me roubam a madrugada, suando de agonia.
Preciso morrer por um instante.
E Deus? O controle do mundo. Por vezes me envergonho estupidamente pela maneira como acho que sou Deus.
Vejo um homem.
Minha mente não desiste, eu tropeço, sou criança! O copo de água quase cai da minha mão. Bebo devagar, meus dedos dormentes segurando o copo gelado. Minha vida é um inverno. Um calor irradia dos meus pés - revejo o homem - estou dançando nua. De repente ele sorri para mim, as rugas ao lado dos olhos formando o clássico pé de galinha, os cabelos grisalhos - meu Deus, por que homens?
Lembro então de minha mãe aos berros, tentando me mostrar o quanto eu era inocente e idiota. Que o mundo é feroz. O mundo é você, mãe - penso - feroz. Se for assim prefiro morrer inocente. Prefiro morrer gorda. Prefiro morrer por um instante.
A água do copo não termina nunca. Meus dedos já não são banhados por sangue.
O homem diz:
- Você me deixa sem graça.
Eu sorrio. Quero o homem agora mesmo. - Balanço a cabeça - não, quero juventude! Chega de homens!
Derramo o restante de água no chão. Não se é possível encher um corpo já cheio.

Comentários

Postagens mais visitadas