Perda
(Laís Moura)
Me aconteceu um estranho pensamento de que minha vida é uma farsa. Por um lado, alienação, por outro - aqui encaixo os extremistas depressivos - a vida é uma merda, o ser humano é uma merda, tudo é plural, a vida é muito mais que vejo, a liberdade não existe, o amor é utopia, Jesus Cristo é uma lenda, etc, etc, etc.
Vi, por fim, que não consigo ficar no meio, talvez por que não exista um meio. Ou existe e ninguém pisou lá ainda? Acho que andei pensando na verdadeira raiz de mim mesma: tive uma overdose de Clarice Lispector. Comecei com a droga mais pesada "A hora da estrela" e cá estou remoendo minhas unhas com "A paixão segundo G.H.". Uma morte doce, chegou de mansinho. Satisfeita, Clarice? Depois de morta sua alma perpetua em meus neurônios. Era isso que você queria?
Era?
Pois bem. Perdi minha própria escrita. Isso é o que dá: você lê um livro achando que ele vai aumentar seu mundo e pimba, é praticamente um adultério. No início tudo é flores, você escorrega os dedos deliciado com a descoberta de um amor singelo. Depois brigamos: livro acaba e meu tédio afunda. Trocarei você por outro, (exclamação) pode ir embora! E o livro vai. Deixa as marcas e demora mil anos para recuperar meu estilo narrador-pensador-eu.
Acabo de reler o texto. Tento me achar, nada. O texto começa com Cla e termina com Rice. Acabo de pensar: Será que somos mais influenciados do que pensamos? Um texto autobiográfico pode se tornar irreconhecível para o autor?
Pode. Ou não pode? Reconheceria em mim em Clarice? Posso ser Clarice por instantes?
Quero esquecer. Vou tentar esquecer e já volto; não demoro, sim?
Voltei. Essa luz do meu quarto é pálida demais (espanto) esqueça. Não gostei do que acabei de escrever, mas como Clarice não vou apagar.
Ando pensando demais em baratas e galinhas. Com a quantidade de texto sobre estas, tenho certeza que ela já teve uma galinha de estimação e comeu-a tempos depois com um pedaço de barata no meio.
(susto) este texto não é meu. Vou tirar o "(Laís Moura)" lá de cima. Não quero um texto longo e confuso. Não quero Clarice mais.
Viro a página seguinte.
Me aconteceu um estranho pensamento de que minha vida é uma farsa. Por um lado, alienação, por outro - aqui encaixo os extremistas depressivos - a vida é uma merda, o ser humano é uma merda, tudo é plural, a vida é muito mais que vejo, a liberdade não existe, o amor é utopia, Jesus Cristo é uma lenda, etc, etc, etc.
Vi, por fim, que não consigo ficar no meio, talvez por que não exista um meio. Ou existe e ninguém pisou lá ainda? Acho que andei pensando na verdadeira raiz de mim mesma: tive uma overdose de Clarice Lispector. Comecei com a droga mais pesada "A hora da estrela" e cá estou remoendo minhas unhas com "A paixão segundo G.H.". Uma morte doce, chegou de mansinho. Satisfeita, Clarice? Depois de morta sua alma perpetua em meus neurônios. Era isso que você queria?
Era?
Pois bem. Perdi minha própria escrita. Isso é o que dá: você lê um livro achando que ele vai aumentar seu mundo e pimba, é praticamente um adultério. No início tudo é flores, você escorrega os dedos deliciado com a descoberta de um amor singelo. Depois brigamos: livro acaba e meu tédio afunda. Trocarei você por outro, (exclamação) pode ir embora! E o livro vai. Deixa as marcas e demora mil anos para recuperar meu estilo narrador-pensador-eu.
Acabo de reler o texto. Tento me achar, nada. O texto começa com Cla e termina com Rice. Acabo de pensar: Será que somos mais influenciados do que pensamos? Um texto autobiográfico pode se tornar irreconhecível para o autor?
Pode. Ou não pode? Reconheceria em mim em Clarice? Posso ser Clarice por instantes?
Quero esquecer. Vou tentar esquecer e já volto; não demoro, sim?
Voltei. Essa luz do meu quarto é pálida demais (espanto) esqueça. Não gostei do que acabei de escrever, mas como Clarice não vou apagar.
Ando pensando demais em baratas e galinhas. Com a quantidade de texto sobre estas, tenho certeza que ela já teve uma galinha de estimação e comeu-a tempos depois com um pedaço de barata no meio.
(susto) este texto não é meu. Vou tirar o "(Laís Moura)" lá de cima. Não quero um texto longo e confuso. Não quero Clarice mais.
Viro a página seguinte.
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