Viagem, constelações e um pouquinho de sal

(Laís Moura)

Quando ela me disse aquelas coisas eu não passava de um metro e meio. Engraçado como a gente recorda coisas tão singelas, como o jeito que alguém segurou uma xícara, ou como sua mãe passava a mão no cabelo quando estava com calor. Dentre essas coisas eu lembrava de minha avó naquela tarde de domingo, chuva caindo do céu e ela folheando a revista na cabeceira da cama.
- Olhe aí, o homem já foi na lua...
- Bobagem, vó. - Repliquei. - Não acredite nessas coisas.
Ela me fitou um tempo com seus olhos e os óculos na ponta do nariz, como quem procura as melhores palavras para convencer uma neta teimosa. Ela ergueu ambas as sobrancelhas e disse:
- Você acredita em coisas por tão pouco, e custa a acreditar no poder da tecnologia... Vê, você tem esses celulares e acredita que eles tem o poder de te conectar com as pessoas a sua volta: não tem. Celular não beija, celular não abraça. E você deixa de acreditar na capacidade do homem de viajar uns tantos quilômetros...? O homem foi a lua, foi sim. O homem foi para Marte. Um dia o homem pode ir para Saturno, pode até chegar pertinho do sol sem derreter. Se acredito nisso? Acredito.
Não olhe assim para a minha cara, acreditar é diferente de ter fé. Há muitos perdi a fé no homem. Pois, veja você, eles com essa ânsia de colonizar tudo e todos foram incapazes de colonizar o próprio coração... Se antes de trilharem o caminho para fora de casa cuidassem dessa coisa pulsante e vermelha dentro de si, Marte e Saturno seriam esquecidas. Como numa viagem gostosa de que a gente faz, e fica aquele gostinho de não quero voltar...
Se um dia os seres humanos forem a mares nunca d'antes navegados das emoções e avistarem o coração, me acorde...!
Fechou os olhos e deu seu último suspiro.

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