Esqueça o que eles dizem

(Laís Moura)

Eles sempre me disseram que a minha repulsa contra a mídia e tudo a que ela envolve ia fazer falta nos meus planejamentos futuros. Disseram que as notícias caem nas provas, que o mundo gira em torno das atualidades (e, portanto, gira em torno dos espertos).
O que eles não sabem é que não é o mundo que gira em torno das atualidades, e sim as atualidades que giram o mundo. Mas fala sério, isso tem diferença? É tudo hipocrisia, e de um jeito ou de outros somos humanos. Não adianta Che Guevara nem Renato Russo; Por mais que eu caia em mim mesma e perceba a podridão que envolve a sociedade, temos que viver nela. Somos capacitados para isso, somos produzidos para a adaptção. Mas o Jornal Nacional...
- Merda...
Olhei em direção à voz que lamentava, e através dos óculos escuros vi uma mulher bem feita, bela, e depressiva. Com uma lata de cerveja na mão, ela ajeitava os bilhões de papéis que voavam pela ponte do Parque Central. Corri e fui catando os papéis junto com ela, e após entregá-los ela me olhou com um quê de desprezo e falou:
- Obrigada. - E seguiu em frente sem nem olhar para mim. Mal virou a esquina e o mesmo acidente, e naquela hora Merda já tinha evoluído para outras palavras bem grandes. Pensei em ignorar aquela mulher que aparentemente tinha tudo para fazer sucesso no mercado masculino (visto que só faltou cuspir seu veneno em cima de mim), mas fiz meu traseiro dar meia volta e ir em direção àquela desequilibrada em cima de um par de Prada. Enquanto recolhia novamente uma corrente de vento trouxe um cheiro de canela adocicado, e me perguntei quem usaria um perfume com cheiro de canela.
- Que papéis são esses, se não é me meter demais? - Perguntei. - E por quê não coloca num classificador ou algo do tipo em vez de segurá-los na mão?
Ela me olhou de esguelha, e virando o resto da latinha na boca disse:
- É um roteiro. Um roteiro que acabou de ser impresso.
- Ah. É de uma apresentação ou algo do tipo?
Ela parou de recolher e me olhou de forma estupefata, gaguejando no início:
- Está de brincadeira comigo?
- Por quê estaria?
- Não sei. As pessoas não costumam ser casuais comigo.
- Só por quê tem dinheiro? - Perguntei enquanto olhava o Rolex do seu pulso.
- Também. - Suspirou ela, e agradecendo (dessa vez de verdade) foi embora.
Não pensei nela no resto do dia, apenas fiquei imaginando que diabos faria quando voltasse pro colégio. Não era um ano necessariamente animador, e ver meus amigos num ano acima certamente não estavam nos meus planos.
Mas a vida é mãe. Ela sempre faz os planos por você, não importa quão velho você seja. Então, quanto mais ciente ficamos disso, mais planos fazemos, e eu estava um pouco cansada demais. Aquelas férias tinham sido diferentes, reflexivas, mas não me considerava pronta para ser julgada. Assim como tinha acabado de julgar aquela mulher extremamente bonita à olho nu.
Cansei de andar no parque e voltei para a casa. Não estava pretendendo encontrar minha irmã no maldito sofá assistindo novela e perguntando aonde estava, apenas queria minha cama e meu headfone. Enquanto eu tomava o café da noite, de costas para a TV, ouvi o diálogo medíocre:
- Não era isso que você esperava de mim, era Marcos?
- O que quer dizer?
- Ter sua melhor amiga, exposta nos jornais e revistas, nua?
- Você já é adulta. Toma suas próprias decisões.
- O que disse?
- Está surpresa, Helena? Está?
- Não sei. As pessoas não costumam ser casuais comigo.
Parei de mastigar e rapidamente me virei em direção à TV. E me olhando de forma indignada e surpresa, estava uma mulher extremamente bonita à olho nu e parecendo vazia em cima de seus saltos prada.

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