O poder da conquista
(Laís Moura)
Essa história até hoje me intriga.
Há dois anos atrás, tive o ofrtúnuo de conhecer (mas será que realmente conheci?) um professor chamado Marcos (apenas um pseudônimo) que foi substituido por demissão da antiga professora, onde a fama de bruxa a precedia. Passei aquele período escolar (estava eu no oitavo ano) sem qualquer tipo de problema de fato, até que por volta do segundo semestre notei seus olhares - podemos denominar desse jeito - um tanto efusivos. Passava do primeiro ao último minuto de olho em mim, como se a sala de aula se resumisse às nossas presenças. Chamava minha atenção das poucas vezes que me virava (todas para pedir alguma coisa emprestada) e me observava com uma curiosidade escrita na testa, e não foram poucas as vezes que me observava enquanto saia da sala até me perder de vista.
Intrigada, resolvi compartilhar da minha percepção para minhas amigas mais próximas, e a partir daí elas confirmaram tudo que supostamente eu havia reparado. Saindo da área da imaginação e entrando numa dimensão real, tirei diversas interpretações desse olhado excessivo, mas não consegui chegar à nenhuma certeza. Afinal, eu tinha lá pelos meus 13 anos, e meus dotes femininos estavam bem longe de atrair qualquer tipo de atração de um cara, ainda mais de um professor, que sem bastar o cargo e a responsabilidade da profissão, era mais de 10 anos mais velho.
Mal sabia eu que no mundo que se respira esse tipo de coisa nos dias atuais não é uma anomalia, e que seres que nem Marcos habitavam em todo lugar desse planeta cansado. Acabei por fim, lá pelo finzinho do ano, aceitando essa ideia (que me parecia absurda). Mas esporadicamente uma perguntava assaltava minha paz : "Por que eu?"
Férias. Tempo de curtição, compras, torrar no sol até não aguentar mais, ir pro shopping, dormir, ir pro shopping, ver filmes, viajar. Marcos em nenhum momento das minhas férias me veio à cabeça, e só me lembrei desse fato na semana anterior ao início das aulas. E num piscar de olhos, lá estava eu no meu nono ano.
- E aí Laís, como foram as férias?
- Legais. - Respondi num tom um tanto superficial, como acontece na maioria das vezes que um adulto se dirige à uma garota alienada e presa em seu próprio mundinho.
E, sem surpresa, começou o falatório da matéria, onde eu tinha que me concentrar no que ele dizia e não por que se dirigia a mim, caso contrário me veria na tão desesperadora recuperação. Um dia, fui tirar uma dúvida de uma atividade extra (que aparentemente apenas eu tinha feito), e de duas aulas inteiras para dar, ele se resumiu a corrigir a minha tarefa ao seu lado (de vez em quando encostando no dorso da minha mão para enfatizar algo [ou pelo menos assim eu queria acreditar]). Quando estava perto de bater a última aula, anunciou:
- A atividade vale 0,5 décimos.
Fiquei de boca aberta. Era exatamente o valor que eu precisava tirar para conseguir meu 6,0 cravado.
- Ah, eu fiz a atividade! - Disse um colega, que também levou 0,5 décimos.
"Eu também!" - Disse um. - "Eu também!" - Disse outro.
- Me arrependi de ter botado décimos extras nessa tarefa. - Disse ele rindo para mim. - Agora já foi...
Não identifiquei nenhum tipo de remorso, entretando.
X
Na metade do segundo semestre, o professor propôs uma atividade em slides para ser apresentada em trio. Junto comigo foram Fernanda e Rodrigo, e após o término da execução do trabalho, anexamos-o via e-mail e mandamos o bendito para Rodrigo, que salvou em seu MP4. (Naquela época era um tanto comum o uso do aparelho. [Naquela época. Isso foi ano passado]).
Porém no dia da apresentação propriamente dita, Rodrigo tinha simplismente esquecido do trabalho e afirmado que ninguém tinha o alertado sobre, o que nos causou um desespero repentino (afinal, dois pontos naquela matéria era preciosidade para a maior parte da turma[principalmente para mim, que precisava imensamente]). A breve idéia de zerar era um tanto terrível, e a irritação no meu estômago devido ao nervosismo atacou. Enjoada, corri junto com Fernanda até o professor, explicando a história (e nem um pouco preocupada em por a culpa em Rodrigo, que cinicamente tentava evacuar sua culpa no cartório).
- Calma, calma meninas. Alguma de vocês moram perto daqui?
- Eu moro! - Disse Fernanda.
- Então vão lá rapidinho e voltem, enquanto os outros grupos de apresentam. Vou deixar o de vocês por último. - Disse ele, dando uma piscadela para mim.
- Valeu professor!
Saímos correndo tão desesperadamente que Fernanda quase foi atropelada, causando uma leve colisão entre dois carros.
- VOCÊS ESTÃO DOIDAS?! - Disse o cara que quase atropelou - EU PODERIA TER MATADO VOCÊS!
Ah, a arte da dramatização...
- Desculpe, desculpe!
E buzinas engoliram todas as nossas desculpas.
- Bora, bora Fernanda!
E tratamos a correr, chegando sãs e salvas no apartamento de fernanda. Escorreguei na poça de água do playground, e por pouco não torci minha mão. Ligamos o notebook da mãe dela e abrimos o trabalho, prontas para salva-lo no MP4 dela.
O problema era: onde estava o fio?
Desespero. Começamos a abrir todas as gavetas possíveis e imaginárias, e a única coisa que me impedia de chorar era a adrenalina.
- Não tá em porra de lugar nenhum! - Gritou Fernanda, acordando a casa inteira.
- Tá, você tem CD virgem?
Pegamos uma pilha de cds que poderiam ser virgens e abrimos, mas todos haviam algo escrito como "eu" ou "fotos formatura" ou "Niver". Atordoada, paramos para pensar e tive a ideia:
- E-mail! Tá no e-mail, vamo para a lan house e a gente salva num cd que a gente compra lá!
- Mas eu não tenho dinheiro!
- Como assim, Fernanda? Você tá em casa!
- Eu sei, mas ninguém tá com dinheiro aqui, e minha mãe já saiu de casa...
Abri a porta e chamei o elevador.
- Para onde você vai?
- Para a lan house, oras!
- Com que dinheiro?!
- Ora, - suspirei. - Vamos pedir para alguém.
X
"Certo" - Raciocinei comigo mesma. - "Um CD virgem é no máximo 1,00." Apenas um real.
- Não acredito que estamos fazendo isso. - Resmungou Fernanda.
Assim que saímos do prédio uma mulher passou um pouco apressada, e interrompi seu trajeto euforicamente:
- MOÇA, MOÇA, pelo amor de Deus, você tem um real?
Ela olhou para o nosso estado e perguntou:
- Para quê exatamente...?
- Um trabalho. Urgente.
- Ah, tenho... - E caçou na sua bolsa um real em cédula, que não era escasso naquela época.
- Obrigada!
Corremos até a lan house, e enquanto imprimíamos, meu celular tocou.
- Alô?
- Laís? Oi, sou eu, Marcos.
- MARCOS, Você não vai acreditar, a gente não achou o cabo do negócio, e aí não tinha CD virgem, e não tinha dinheiro, a gente teve que mendigar para conseguir e agora estamos aqui já imprimindo bem perto do colégio, ai será que...
- Laís, relaxe meu amor, calma... Tem tempo ainda. Só vão o mais rápido possível, o que eu acredito que vocês já estejam fazendo. O último grupo está para se apresentar agora.
Desliguei o telefone, e quando fui pagar pelo CD o cara disse:
- É 1,20.
Fernanda choramingou:
- Ah, será que...
- DEPOIS TE PAGAMOS O RESTO!
E puxei-a para fora da loja, e só quando pus os pés na rua percebi que estava chovendo. Protegi o CD embaixo do uniforme e corri a toda, rindo com Fernanda de desespero. Quando entramos no auditório, pude finalmente respirar e apresentar meu trabalho cansada (afinal, a adrenalina havia esgotado minhas energias) e fiquei totalmente satisfeita com meus 1,8.
Marcos sorriu para mim em cumplicidade, e quando meu boletim veio, vi que tinha mais uma vez passado com 6 cravado, apesar de que com a nota do trabalho eu ter ficado com 5,8.
Naquela altura eu já tinha certeza do que eu era capaz. E não gostava nada disso.
Baseado em fatos reais.
Essa história até hoje me intriga.
Há dois anos atrás, tive o ofrtúnuo de conhecer (mas será que realmente conheci?) um professor chamado Marcos (apenas um pseudônimo) que foi substituido por demissão da antiga professora, onde a fama de bruxa a precedia. Passei aquele período escolar (estava eu no oitavo ano) sem qualquer tipo de problema de fato, até que por volta do segundo semestre notei seus olhares - podemos denominar desse jeito - um tanto efusivos. Passava do primeiro ao último minuto de olho em mim, como se a sala de aula se resumisse às nossas presenças. Chamava minha atenção das poucas vezes que me virava (todas para pedir alguma coisa emprestada) e me observava com uma curiosidade escrita na testa, e não foram poucas as vezes que me observava enquanto saia da sala até me perder de vista.
Intrigada, resolvi compartilhar da minha percepção para minhas amigas mais próximas, e a partir daí elas confirmaram tudo que supostamente eu havia reparado. Saindo da área da imaginação e entrando numa dimensão real, tirei diversas interpretações desse olhado excessivo, mas não consegui chegar à nenhuma certeza. Afinal, eu tinha lá pelos meus 13 anos, e meus dotes femininos estavam bem longe de atrair qualquer tipo de atração de um cara, ainda mais de um professor, que sem bastar o cargo e a responsabilidade da profissão, era mais de 10 anos mais velho.
Mal sabia eu que no mundo que se respira esse tipo de coisa nos dias atuais não é uma anomalia, e que seres que nem Marcos habitavam em todo lugar desse planeta cansado. Acabei por fim, lá pelo finzinho do ano, aceitando essa ideia (que me parecia absurda). Mas esporadicamente uma perguntava assaltava minha paz : "Por que eu?"
Férias. Tempo de curtição, compras, torrar no sol até não aguentar mais, ir pro shopping, dormir, ir pro shopping, ver filmes, viajar. Marcos em nenhum momento das minhas férias me veio à cabeça, e só me lembrei desse fato na semana anterior ao início das aulas. E num piscar de olhos, lá estava eu no meu nono ano.
- E aí Laís, como foram as férias?
- Legais. - Respondi num tom um tanto superficial, como acontece na maioria das vezes que um adulto se dirige à uma garota alienada e presa em seu próprio mundinho.
E, sem surpresa, começou o falatório da matéria, onde eu tinha que me concentrar no que ele dizia e não por que se dirigia a mim, caso contrário me veria na tão desesperadora recuperação. Um dia, fui tirar uma dúvida de uma atividade extra (que aparentemente apenas eu tinha feito), e de duas aulas inteiras para dar, ele se resumiu a corrigir a minha tarefa ao seu lado (de vez em quando encostando no dorso da minha mão para enfatizar algo [ou pelo menos assim eu queria acreditar]). Quando estava perto de bater a última aula, anunciou:
- A atividade vale 0,5 décimos.
Fiquei de boca aberta. Era exatamente o valor que eu precisava tirar para conseguir meu 6,0 cravado.
- Ah, eu fiz a atividade! - Disse um colega, que também levou 0,5 décimos.
"Eu também!" - Disse um. - "Eu também!" - Disse outro.
- Me arrependi de ter botado décimos extras nessa tarefa. - Disse ele rindo para mim. - Agora já foi...
Não identifiquei nenhum tipo de remorso, entretando.
X
Na metade do segundo semestre, o professor propôs uma atividade em slides para ser apresentada em trio. Junto comigo foram Fernanda e Rodrigo, e após o término da execução do trabalho, anexamos-o via e-mail e mandamos o bendito para Rodrigo, que salvou em seu MP4. (Naquela época era um tanto comum o uso do aparelho. [Naquela época. Isso foi ano passado]).
Porém no dia da apresentação propriamente dita, Rodrigo tinha simplismente esquecido do trabalho e afirmado que ninguém tinha o alertado sobre, o que nos causou um desespero repentino (afinal, dois pontos naquela matéria era preciosidade para a maior parte da turma[principalmente para mim, que precisava imensamente]). A breve idéia de zerar era um tanto terrível, e a irritação no meu estômago devido ao nervosismo atacou. Enjoada, corri junto com Fernanda até o professor, explicando a história (e nem um pouco preocupada em por a culpa em Rodrigo, que cinicamente tentava evacuar sua culpa no cartório).
- Calma, calma meninas. Alguma de vocês moram perto daqui?
- Eu moro! - Disse Fernanda.
- Então vão lá rapidinho e voltem, enquanto os outros grupos de apresentam. Vou deixar o de vocês por último. - Disse ele, dando uma piscadela para mim.
- Valeu professor!
Saímos correndo tão desesperadamente que Fernanda quase foi atropelada, causando uma leve colisão entre dois carros.
- VOCÊS ESTÃO DOIDAS?! - Disse o cara que quase atropelou - EU PODERIA TER MATADO VOCÊS!
Ah, a arte da dramatização...
- Desculpe, desculpe!
E buzinas engoliram todas as nossas desculpas.
- Bora, bora Fernanda!
E tratamos a correr, chegando sãs e salvas no apartamento de fernanda. Escorreguei na poça de água do playground, e por pouco não torci minha mão. Ligamos o notebook da mãe dela e abrimos o trabalho, prontas para salva-lo no MP4 dela.
O problema era: onde estava o fio?
Desespero. Começamos a abrir todas as gavetas possíveis e imaginárias, e a única coisa que me impedia de chorar era a adrenalina.
- Não tá em porra de lugar nenhum! - Gritou Fernanda, acordando a casa inteira.
- Tá, você tem CD virgem?
Pegamos uma pilha de cds que poderiam ser virgens e abrimos, mas todos haviam algo escrito como "eu" ou "fotos formatura" ou "Niver". Atordoada, paramos para pensar e tive a ideia:
- E-mail! Tá no e-mail, vamo para a lan house e a gente salva num cd que a gente compra lá!
- Mas eu não tenho dinheiro!
- Como assim, Fernanda? Você tá em casa!
- Eu sei, mas ninguém tá com dinheiro aqui, e minha mãe já saiu de casa...
Abri a porta e chamei o elevador.
- Para onde você vai?
- Para a lan house, oras!
- Com que dinheiro?!
- Ora, - suspirei. - Vamos pedir para alguém.
X
"Certo" - Raciocinei comigo mesma. - "Um CD virgem é no máximo 1,00." Apenas um real.
- Não acredito que estamos fazendo isso. - Resmungou Fernanda.
Assim que saímos do prédio uma mulher passou um pouco apressada, e interrompi seu trajeto euforicamente:
- MOÇA, MOÇA, pelo amor de Deus, você tem um real?
Ela olhou para o nosso estado e perguntou:
- Para quê exatamente...?
- Um trabalho. Urgente.
- Ah, tenho... - E caçou na sua bolsa um real em cédula, que não era escasso naquela época.
- Obrigada!
Corremos até a lan house, e enquanto imprimíamos, meu celular tocou.
- Alô?
- Laís? Oi, sou eu, Marcos.
- MARCOS, Você não vai acreditar, a gente não achou o cabo do negócio, e aí não tinha CD virgem, e não tinha dinheiro, a gente teve que mendigar para conseguir e agora estamos aqui já imprimindo bem perto do colégio, ai será que...
- Laís, relaxe meu amor, calma... Tem tempo ainda. Só vão o mais rápido possível, o que eu acredito que vocês já estejam fazendo. O último grupo está para se apresentar agora.
Desliguei o telefone, e quando fui pagar pelo CD o cara disse:
- É 1,20.
Fernanda choramingou:
- Ah, será que...
- DEPOIS TE PAGAMOS O RESTO!
E puxei-a para fora da loja, e só quando pus os pés na rua percebi que estava chovendo. Protegi o CD embaixo do uniforme e corri a toda, rindo com Fernanda de desespero. Quando entramos no auditório, pude finalmente respirar e apresentar meu trabalho cansada (afinal, a adrenalina havia esgotado minhas energias) e fiquei totalmente satisfeita com meus 1,8.
Marcos sorriu para mim em cumplicidade, e quando meu boletim veio, vi que tinha mais uma vez passado com 6 cravado, apesar de que com a nota do trabalho eu ter ficado com 5,8.
Naquela altura eu já tinha certeza do que eu era capaz. E não gostava nada disso.
Baseado em fatos reais.
Comentários